Uma das épocas singulares no tempo litúrgico da igreja católica é a Quaresma. É um tempo de preparação para a celebração da Páscoa do Senhor. É um convite ao arrependimento e à conversão. Quaresma é “o caminho que leva ao lugar do coração”. Todos os caminhos nos conduzem a uma meta...neste tempo Santo, o nosso olhar fixa-se no caminho para o Calvário. É aí que queremos chegar. Por isso, ‘colocarmo-nos a caminho’ e ‘predispormo-nos’ para escutar atentamente a voz interior da nossa consciência e desfrutar a Palavra do Senhor que nos conduz ao longo deste tempo litúrgico. “A Quaresma é o tempo privilegiado da peregrinação interior até Àquele que é a fonte da misericórdia. Nesta peregrinação, ele próprio nos acompanha através do deserto da nossa pobreza, amparando-nos no caminho que leva à alegria intensa da Páscoa” (João Paulo II, mensagem para a Quaresma 2004) A Quaresma é um tempo no qual somos convidados a parar; para revermos com verdade a nossa maneira de ser, a esforçarmo-nos por descobrir qual é a vontade ou o projecto que Deus tem para cada um de nós. Mais do que preocuparmo-nos em como fazer (simples atitude de repetir actos ou gestos que, muitas vezes, acabam por ser superficiais, sem nenhum tipo de compromisso pessoal), se calhar é importante perguntarmos pelo porquê do conjunto de «rituais» que adoptamos, ou em função do «cumprimento das normas», ou com a intenção da nossa permanente atitude de conversão. O deserto que sua santidade João Paulo II menciona aqui; é entendido como lugar, espaço físico-geográfico em que o Homem é chamado a viver a dialéctica da felicidade e da desgraça, da verdade e da falsidade; e a procurar a harmonia que, no seu dia-a-dia, se vai consolidando, com a consciência de nem sempre realizar o que se propõe alcançar. Os Quarenta dias da Quaresma que iremos saborear neste tempo litúrgico significam, por sua vez, a totalidade da nossa existência, a vida vivida inteiramente inserida no devir do tempo, plenamente absorvida pelos acontecimentos, progressos e recuos que constituem a história pessoal cada um. Ao longo destes quarenta dias, a Igreja propõe de modo especial alguns gestos que cada um possa fazer como a atitude de conversão, tais como Jejum, Esmola e Oração. O JEJUM «O JEJUM» tem como finalidade o amor de Deus e o abandono ao Pai. O verdadeiro jejum transforma-se no puro acto de amar. O jejum é uma permanente atitude de alteridade, isto é, busca ininterrupta de diferentes formas de sair/ ir ao encontro, numa atitude de humilde e de reverência, não como quem se impõe aos demais, mas como quem serve. “O Jejum, que pode ter diversas motivações, adquire para o cristão um significado profundamente religioso: tornando mais pobre a nossa mesa aprendemos a superar o egoísmo para viver na lógica da doação e do amor; suportando as privações de algumas coisas – e não só do supérfluo – aprendemos a desviar o olhar do nosso «eu», para descobrir Alguém ao nosso lado e reconhecer Deus nos rostos de tantos irmãos nossos. Para o cristão o jejum nada tem de intimista, mas abre em maior medida para Deus e para as necessidades dos homens, e faz com que o amor a Deus seja também amor ao próximo” (cf. Mc 12, 31). (Bento XVI, mensagem para a Quaresma 2011) A ESMOLA «DAR ESMOLA» significa, antes de mais, sair ao encontro de, entrar em relação com, escutar o outro para conhecê-lo bem...sem o conhecimento do outro, mais difícil se torna a partilha e, consequentemente, a entrada na comunhão. A atitude de quem oferece/dá tem de ser radicalmente prudente, comedida, ponderada. Porque quem está disposto a «dar», precisa também de perceber se o outro está em condições de «receber» a oferta. Praticar a caridade não é um simples acto de «dar». A caridade é fruto do amor de Deus em nós e, por isso, deve ser saboreado/provado com gozo, simplicidade e humildade. “ No nosso caminho encontramo-nos perante a tentação do ter, da avidez do dinheiro, que insidia a primazia de Deus na nossa vida. A cupidez da posse provoca violência, prevaricação e morte: por isso a Igreja, especialmente no tempo quaresmal, convida à prática da esmola, ou seja, à capacidade de partilha. A idolatria dos bens, ao contrário, não só afasta do outro, mas despoja o homem, torna-o infeliz, engana-o, ilude-o sem realizar aquilo que promete, porque coloca as coisas materiais no lugar de Deus, única fonte da vida. Como compreender a bondade paterna de Deus se o coração está cheio de si e dos próprios projectos, com os quais nos iludimos de poder garantir o futuro? A tentação é a de pensar, como o rico da parábola: «Alma, tens muitos bens em depósito para muitos anos...». «Insensato! Nesta mesma noite, pedir-te-ão a tua alma...» (Lc 12, 19-20). A prática da esmola é uma chamada à primazia de Deus e à atenção para com o próximo, para redescobrir o nosso Pai bom e receber a sua misericórdia.” (Bento XVI, mensagem para a Quaresma 2011) A ORAÇÃO «A ORAÇÃO» brota da escuta da Palavra. Para que a nossa oração não seja palavreado, tem de se alimentar no silêncio. ‘como é bom sentir que Deus vem ao nosso encontro! ‘ Deixemos, então, que ele nos encontre nesta Quaresma. A ORAÇÃO torna-se assim num movimento de encontro ascendente e descendente do Deus, dador da vida e da comunhão, com o homem, criado e chamado à comunhão com Ele. Rezar é também colocar-se na presença de Deus, numa atitude de confiança filial e de radical entrega nas mãos daquele que por nós tudo ofereceu; é estar a sós com Deus. “Em todo o período quaresmal, a Igreja oferece-nos com particular abundância a Palavra de Deus. Meditando-a e interiorizando-a para a viver quotidianamente, aprendemos uma forma preciosa e insubstituível de oração, porque a escuta atenta de Deus, que continua a falar ao nosso coração, alimenta o caminho de fé que iniciámos no dia do Baptismo. A oração permite-nos também adquirir uma nova concepção do tempo: de facto, sem a perspectiva da eternidade e da transcendência ele cadencia simplesmente os nossos passos rumo a um horizonte que não tem futuro. Ao contrário, na oração encontramos tempo para Deus, para conhecer que «as suas palavras não passarão»” (Bento XVI, mensagem para a Quaresma 2011) Assim, estaremos capazes de viver uma Quaresma agradável aos olhos de Deus e favorável à «nossa realização», como filhos e filhas queridos por Deus. Afmend ofm ______________________________________
domingo, 13 de março de 2011
Quaresma: tempo de peregrinação interior
Publicada por Afmend Sarmento à(s) 10:13
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